Campanhas, peditórios e donativos dão 40 por cento do dinheiro com que a Cáritas Diocesana de Aveiro trabalha

Diácono José Alves, presidente da direção da Cáritas Diocesana de Aveiro

De 12 a 19 de março decorre a Semana Nacional Cáritas, que inclui um peditório de rua. O Correio do Vouga foi ao encontro do diácono permanente José Ferreira Alves, presidente da Cáritas Diocesana de Aveiro. A entrevista realizou-se já depois da notícia que refere que o Ministério Público abriu um inquérito à Cáritas Diocesana de Lisboa – assunto que naturalmente foi abordado –, mas tinha sido marcada anteriormente para falar da Cáritas de Aveiro, que, como todas as Cáritas diocesanas, é autónoma. Entrevista conduzida por Jorge Pires Ferreira

 

CORREIO DO VOUGA – Vamos ter esta semana o peditório da Cáritas. Quantas pessoas vão estar na rua com as latas da Cáritas?
JOSÉ ALVES – Entre grupos paroquiais da Cáritas e voluntários, estimamos para cima de 60 pessoas. Estamos no terreno para recolher dádivas, mas também para informar as pessoas e divulgar a mensagem desta semana: “Família, construtora da paz”.

Qual a aplicação que vai ser dada ao dinheiro que se vai recolher?
As verbas destinam-se na totalidade ao apoio a pessoas necessitadas. 65 por centro do dinheiro recolhido fica na Diocese de Aveiro; 35 por cento vai para a Cáritas Portuguesa. Da verba que fica em Aveiro, metade fica na Cáritas Diocesana (ou seja, 32,5 por cento do total), que abrange toda a diocese, e outra metade é distribuída pelos diversos grupos paroquiais da Cáritas.
No ano passado, o peditório da Semana Nacional quanto recolheu na diocese?
8620 euros e 37 cêntimos.

Nestes últimos meses, a Cáritas Diocesana de Aveiro esteve muito dedicada a revolver as emergências dos fogos de verão. Pode fazer-nos um ponto da situação?
Sim, é oportuno fazer um ponto de situação. Como é sabido, a região de Aveiro sofreu algumas situações críticas. A Cáritas assumiu a responsabilidade de apoiar três situações concretas. Primeira: uma firma de A-dos-Ferreiros, com 22 empregados, que ardeu completamente, mas não despediu ninguém e está a trabalhar provisoriamente em instalações cedidas pela Câmara Municipal de Águeda. O apoio da Cáritas para equipamentos de necessidade imediata para funcionamento da empresa foi de 46.181,82 euros. O processo está encerrado. A segunda situação tem a ver com uma família do Préstimo (Águeda) que viu destruídos os seus anexos e máquinas agrícolas. A Cáritas apoia com 20.215 euros. Neste momento falta pagar 3304,61. Penso que ainda esta semana o processo fica encerrado. A terceira situação é a da construção de raiz de uma casa em Vila Nova de Monsarros (Anadia). Prevê-se que a casa esteja concluída em abril. O apoio é de cerca de 63 mil euros. Fizemos o primeiro pagamento, de 24 mil euros, e faltam dois. Para esta família há ainda uma verba extra de três mil euros para mobílias e eletrodomésticos. Por último, mas já fora da Campanha dos Incêndios Florestais 2016, a Cáritas está a ajudar a reconstrução de uma habitação destruída pelo fogo em Sangalhos. A Cáritas paga com cinco mil euros o recheio da habitação. Há ainda apoios locais de pequena monta que são estão referidos nestes números, mas que entrarão no relatório final.

Além de responder a emergências, como foi o caso dos incêndios, a Cáritas tem respostas sociais permanentes…
Sim, podemos agrupá-las em três áreas. A primeira é a da infância, com o Centro de Acolhimento Temporário, que acolhe crianças em situações de perigo. Temos capacidade para 18 e temos neste momento 17 crianças. No mesmo edifício, em Esgueira, funciona o pré-escolar, contratualizado com a Segurança Social. Devo dizer que estamos numa zona de consideráveis problemas sociais, pelo que praticamos mensalidades que são claramente uma resposta de carácter social.
Temos depois o atendimento e acompanhamento social de emergência, a funcionar na sede de Cáritas Diocesana de Aveiro (Rua do Carmo, n.º 42, Aveiro), que inclui um abrigo temporário com capacidade para 10 homens.
E temos, por fim, o atendimento de casos de violência doméstica.

Pode adiantar-nos dados sobre o atendimento social?
Mantém-se estável o número de atendimentos e de pessoas apoiadas. Em 2014, houve 2670 atendimentos (554 pessoas); em 2015, 2458 atendimentos (554 pessoas) e em 2016, 2479 atendimentos (529 pessoas).

E quanto à violência doméstica?
Aqui verificou-se um aumento significativo de 2015 para 2016, de 116 situações para 130.

O aumento não se deverá a uma maior consciência do problema? A um menor medo de o denunciar?
Julgo que a consciencialização está feita. Temo mesmo que seja um agravar das situações.

Com a polémica sobre o dinheiro da Cáritas, temos de lhe perguntar: Como é que Cáritas se financia?
A Cáritas é financiada graças à contratualização das respostas sociais com a Segurança Social e o Ministério da Administração Interna e pelos donativos de pessoas e empresas, beneméritos, benfeitores.

O financiamento de particulares, pessoas e empresas, corresponde a quanto?
O financiamento público andará pelos 60 por cento. O que é angariado pela Cáritas, (campanhas, peditórios, donativos): 40 por cento.

Quantos funcionários tem a Cáritas Diocesana, sabendo-se que é dirigida por uma equipa de voluntários (constituída por sete elementos mais o assistente eclesiástico) que não recebe nada pelo seu trabalho?
Temos 48 funcionários, sendo três a tempo parcial.

Por mês, de quanto é que a Cáritas precisa para pagar salários?
Cerca de 30 mil euros, mais encargos…

Como interpreta a notícia de que a Cáritas Diocesana de Lisboa tem 2,4 milhões de euros no banco?
Gostaria de me pronunciar apenas pela Cáritas Diocesana de Aveiro. As Cáritas Diocesanas são autónomas, cada uma responde por si. Mas a situação de Lisboa não me escandaliza, é normal que haja alguma reserva para fazer face a situações inopinadas. Acontece que por vezes bem queremos ter alguma reserva e não conseguimos.

A Cáritas de Aveiro tem alguma reserva no banco?
Neste momento temos uma pequena reserva. Estamos a procurar angariar alguma verba com donativos específicos porque temos necessidade absoluta de fazer obras na sede, que alberga três respostas sociais: acolhimento de sem-abrigo, atendimento social e apoio na violência doméstica. Temos 10 homens a dormir numa camarata que não tem as melhores condições. Já temos o projeto de arquitetura aprovado na Câmara e esperamos em breve lançar concurso para as obras.

Podemos saber de quanto é essa reserva?
Duzentos e pouco mil euros. Não chega nem de perto nem de longe para as obras que temos de fazer.

As contas da Cáritas de Aveiro são conhecidas?
Prestamos contas todos os anos. São publicadas no “site” da Cáritas Diocesana de Aveiro. Qualquer cidadão tem acesso a elas, sem qualquer intermediação, além que que são transmitidas à Segurança Social. Por outro lado, passamos recibo de todas as ofertas, mesmo em relação às anónimas. Não há qualquer movimento de dinheiro que não seja documentado.

Teme que estas notícias tenham mau efeito na semana e no peditório que está a decorrer?
Influência, acredito que tenham. Quando estas coisas acontecem, muitos cidadãos ficam na dúvida. E se há pessoas que já têm dúvidas, ficam agora com mais reticências. Espero que as pessoas saibam distinguir as situações e vejam a realidade.