Fátima em Damasco, na Síria

Entrevista ao Arcebispo Metropolitano de Damasco dos sírios católicos Provavelmente, o facto de Fátima ser um nome de origem árabe reveste uma singular importância para os católicos do Médio Oriente (M.O.), devotos de Nossa Senhora de Fátima. E talvez a entrada numa das cinco igrejas católicas da Diocese de Damasco tenha despertado a atenção de um dos empresários da Diocese de Aveiro, pois, por detrás do altar, uma bela pintura evoca Nossa Senhora de Fátima.

Respondendo afirmativamente ao convite do empresário Fausto Oliveira, o Arcebispo Metropolitano de Damasco dos Sírios Católicos, Elias Tabe, veio a Portugal para participar nas celebrações do Santuário de Fátima neste mês de Outubro. O Correio do Vouga entrevistou-o.

O Arcebispo Elias Tabe começou por enumerar as sete Igrejas Católicas do Médio Oriente, a saber, a Arménia, a Caldeia, a Copta, a Latina, a Maronita, a Melquita e a Siríaca. É a esta última que pertence este prelado da Diocese de Damasco, Patriarcado de Antioquia. Interessante será referir o facto de que coexistem no Médio Oriente estas Igrejas Católicas e as suas correspondentes Ortodoxas (Siríaca Católica / Siríaca Ortodoxa; Arménia Católica / Arménia Ortodoxa). Dependendo do Vaticano, o que distingue os Católicos Orientais dos Católicos Latinos são três aspectos: a administração; a liturgia e a disciplina. Com efeito, é o sinote (Conferência Episcopal da Igreja Católica do Médio Oriente) que escolhe os seus Bispos, sendo estes confirmados pelo Papa. Quanto à liturgia, seguem os ritos orientais. São, pois, uma Igreja sui iuris (à parte).

A este propósito, o Arcebispo sírio esclareceu que mantêm algumas tradições dos primeiros cristãos, pois o Patriarcado de Antioquia descende directamente das primeiras comunidades (cf. Act 11, 19-26) e foram eles os primeiros a serem chamados de cristãos (cf. Act 11, 26). Relembrando a história da Igreja, referiu o Concílio de Éfeso (431) e a consequente separação do Patriarcado de Antioquia do de Roma.

Por outro lado, os católicos orientais do Médio Oriente apoderaram-se de inúmeros cultos e rituais dos católicos ocidentais, tais como a Celebração da Imaculada Conceição (dogma que não é aceite pelos cristãos ortodoxos); a Exposição e Adoração do Santíssimo Sacramento; a Via-Sacra; os Santos Latinos; as Confrarias; Fátima e a oração do Rosário. O Primado do Papa de Roma é outro aspecto que os distingue dos cristãos ortodoxos.

Falando da liberdade religiosa e da coexistência de religiões, afirmou não haver problemas, exemplificando mesmo com a realização da Procissão do Domingo de Ramos, na Paróquia de Nossa Senhora de Fátima, em Damasco. Apesar de hoje haver menos vocações sacerdotais, elas são suficientes para responder às necessidades da comunidade, tendo a sua Diocese enviado padres para as diversas comunidades siríacas espalhadas pelo mundo. Também em Roma, no Colégio dos Padres Orientais do Médio Oriente, onde estão os padres católicos de todas as Igrejas do M.O. que fazem a sua especialização, se encontra um dos padres da Diocese de Damasco, exercendo as funções de Reitor.

Os cristãos têm alguns privilégios por parte do Governo. De facto, a luz e a água são gratuitas para os locais de culto; os seminaristas são isentos do serviço militar. O ensino religioso é obrigatório na Síria. Em todas as escolas, há padres católicos e muçulmanos para ministrar as respectivas aulas.

Interpelado quanto à intervenção dos católicos na sociedade síria, o Arcebispo Elias Tabe informou que, se, por um lado, a Constituição da Síria impede que um cristão seja Presidente do país, situação comum a todos os países árabes, à excepção do Líbano, que não contempla tal disposição, em termos políticos, os católicos sírios participam na vida partidária e actuam de forma empenhada em termos sociais. Excepto no partido político dos Irmãos Muçulmanos, em todos há presença de cristãos, bem como no Parlamento.

É pela educação familiar, nas igrejas e na comunicação social diocesana que a mensagem da doutrina social da Igreja Católica e os valores do cristianismo são divulgados. Também face a este aspecto se nota uma reacção positiva dos muçulmanos, uma vez que a doutrina social da Igreja não contraria os fundamentos do Islão.

Temas como Direitos Humanos, da Mulher, dos Trabalhadores, Democracia são bem recebidos pelo povo, havendo comportamentos sociais dos cristãos que influenciam os muçulmanos, nomeadamente algumas mulheres.

Antes de terminar, fizemos a pergunta inevitável quanto ao ambiente de guerra que se vive no Médio Oriente. Relembrando a posição do Delegado sírio na ONU e no Conselho de Segurança, o nosso entrevistado reafirmou que a Síria quer a paz. Neste momento, não possuem armas para combater o Iraque, apesar de a campanha orquestrada pelos media americanos querer levá-los a colaborar com os EUA.

Porque não poderia deixar de ser, quisemos saber como vive este Arcebispo sírio as comemorações dos 25 anos de Pontificado de João Paulo II. “Como vocês”, respondeu – também em Damasco haverá uma Celebração comemorativa para a qual foram convidados todos os católicos, os representantes de vários países e as altas individualidades da Síria. Será no dia 16 de Outubro. M. Elias Tabe não estará presente, comemorando entre nós.