Onde está o poder político?

Questões Sociais 1. Uma leitura jurídica e simplista da realidade diz-nos que o poder político se en-contra nos partidos políticos e nos órgãos de soberania: o Presidente da República, a Assembleia da República, o Governo e os Tribunais; é deles que dimanam as leis; são eles que exercem o poder executivo; são eles que julgam os ilícitos.

No entanto, existe uma segunda esfera de poder (“fáctico”, ou de facto) com força crescente. Trata-se das “corporações” em sentido amplo, isto é dos diferentes interesses e mundividências, mais ou menos organizados e difundidos em toda a sociedade: interesses sectoriais, regionais, de “figuras destacadas”, de comentadores, analistas e meios de comunicação social. Aqui se incluem, nomeadamente, as organizações sindicais, profissionais, patronais e empresariais, bem como os grupos de natureza sectorial, regional, cultural e comportamental, que lutam pelos seus interesses e mundividências particulares.

A força desta esfera de poder é de tal forma que, provavelmente, foi ela que, aliada aos partidos da oposição, esteve na origem da cessação de funções, pelo menos, do actual Governo bem como dos três anteriores. E tudo leva a crer que já se esteja a preparar (mesmo sem o reconhecer e talvez sem dar por isso) para derrubar o próximo.

A terceira esfera de poder é a clandestinidade. Aí se situam o não cumprimento da lei, a desonestidade nas relações humanas e sociais, a prática da violência e do crime, organizado ou não, e o terrorismo…

Não se conhece o grau de difusão e de enraizamento da clandestinidade nas nossas sociedades, à escala nacional e internacional. Existem, no entanto, fortes motivos para admitirmos que tal difusão e enraizamento são crescentes. O exemplo da Colômbia é, particularmente, expressivo da evolução deste poder.

2. Podemos admitir, como hipótese de análise, que os órgãos de soberania estejam numa fase de acentuada perda de poder, a favor das “corporações” que, por sua vez, não terão capacidade suficiente para resistir à força bruta da clandestinidade.

As “corporações” actuam fortemente contra os governos, porque estes não governam bem e porque nunca poderão corresponder às expectativas neles depositadas. Na verdade, a experiência do passado mostra que as “corporações” só estariam satisfeitas com os governos se estes conseguissem três objectivos: 1º – despesa pública ilimitada e, ao mesmo tempo, equilíbrio orçamental; 2º – liberdade total e garantias de segurança absoluta; 3º – satisfação de todos os interesses “corporativos”, salvaguardando o bem comum.

A consecução destes objectivos é obviamente inviável, e tudo leva a prever que o egoísmo individual e de grupo continuem a exigi-los cada vez mais. Por tal motivo, os governos continuarão submetidos a pressões permanentes de cidadãos contestatários e insaciáveis, visando sempre a sua demissão.

A alternativa consistiria na cultura e na prática da co-responsabilidade, que se encontram numa fase muito embrionária.