«Vamos à vida, que a morte é certa»

Não nos acontece, por vezes, reler a mesma história com a esperança irracional de que as coisas se passem doutra maneira mais a nosso gosto?
As três leituras de hoje parecem recontar a perene esperança de um milagre contra a morte.
O «milagre da ciência» enfrenta um grande senão: por muito que prolongue a vida, será apenas «esta vida», em que não conseguimos controlar os sinais de morte. A morte é a experiência de que não somos senhores da vida (e maus senhores da sua qualidade).
A leitura do profeta Ezequiel é um pequeno extracto da célebre visão em que ele se vê num vale enorme cheio de ossos ressequidos – imagem do povo destroçado de Israel, já sem esperança de viver. Deus manda-lhe gritar: «Espírito, vem dos quatro ventos, sopra sobre estes mortos, para que eles recuperem a vida!» E eles ergueram-se como um exército cheio de energia. Deus é aquele que chama para a vida.
Esta visão de Ezequiel exerceu profunda influência na literatura apocalíptica e no imaginário relacionado com a morte.
Mas a lição é clara: Onde nós vemos morte, vê Deus vida. Onde nós vemos destroços, vê Deus a estrutura de novos tempos. Quando vemos a vida como um lusco-fusco em que nada é claro, em que tudo se esvanece, Deus vê o lusco-fusco de um eterno amanhecer, vê a maravilha – o «milagre» – do nascer sempre novo.

 

Manuel Alte da Veiga
m.alteveiga@netcabo.pt
(Este texto não segue o novo Acordo Ortográfico)

 

 

Leia o artigo completo na edição em papel do dia 02 de abril de 2014