NUNO QUEIRÓS
Padre. Pároco de Soza
e Santo António de Vagos
As festas trazem às localidades nos meses de verão uma diversidade de eventos e migração de pessoas, muitas vezes congregadas sob o pretexto da comemoração anual dos padroeiros, mobilizando quer os que cá fazem a sua vida, quer os que, na procura de melhores condições, rumaram a outras paragens e regressam nesta época para a visita e convívio familiar e o merecido descanso. A grande maioria das festividades que vão ocorrendo na nossa região tem por base a religiosidade popular e até as consideramos festas religiosas, ainda que esse denominador cada vez saia mais mesclado com um conjunto de práticas que pouco dirão da fé, como se a pretexto da manifestação devocional, nos libertássemos para exageros, vícios e excentricidades que dificilmente são já dispensadas. Cada vez menos a comemoração evocativa do padroeiro, glorificação de Deus admirável nos seus santos, que inspiram pelo seu testemunho a vida dos cristãos, se torna o elemento aglutinador. A Eucaristia festiva, centro desse culto, é pouco cuidada e as procissões correm o risco de se tornarem meras manifestações externas e desfiles que correm o perigo de ser pouco mais que folclore. A “festa do Santo” «quando se esvazia do conteúdo especificamente cristão que estava na sua origem – a honra prestada a Cristo num dos seus membros – transforma-se numa manifestação meramente social, folclórica ou, no melhor dos casos, numa ocasião propícia ao encontro e ao diálogo entre membros de uma mesma comunidade», lê-se no “Diretório sobre a piedade popular e Liturgia” (n.º 233, Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos, 2001).
Não neguemos a oportunidade que a festa traz de reunir a comunidade, trazer a alegria do encontro e a beleza da reunião familiar e convivial. Mas é de preocupar o conjunto de exageros que se vêm verificando e devem questionar-nos. Os avultados recursos humanos que são despendidos anualmente para a organização das festas, empenhados todo o ano na logística e na angariação de fundos económicos que, em certos casos, ascendem às centenas de milhares de euros, “queimados” numa semana em roteiros de diversão e entretenimento de pouca qualidade artística e moral duvidosa, revelam motivações muito pouco claras. Por sua vez, são os setores sociais mais vulneráveis, os pobres e os jovens, que se perdem bastas vezes em «formas de escravidão, novas e subtis» numa «sede desmesurada de prazer egoísta» e libertinagem – menciona o citado diretório – em exageros de toda a monta. Se estivermos atentos e tivermos a oportunidade de deambular nesses ambientes, verificaremos que a festa do padroeiro, além dos elementos essenciais de expressão da fé, que nunca deverão ser descurados, pode tornar-se hoje em arraiais de barulho, palcos de exibição hedonista e até erótica, praças de consumo de álcool e estupefacientes, focos de violência e, em última análise, escolas de transgressão e crime, sob o patrocínio dos santos da nossa devoção.
Os ritmos sociais da moda não nos roubem a genuína alegria do encontro e a partilha do são divertimento que, num contexto cristão, só poderão inspirar uma comunidade mais fraterna.