Quando começou a sua vida pública, Jesus apresentou-nos o seu plano de atividades, os seus objetivos e as estratégias da caminhada. Assim acontece também connosco no início das atividades anuais das empresas, das escolas e até na vida privada. Pela manhã, levantamo-nos com muitas coisas delineadas na cabeça para fazer. Sabemos o que pretendemos alcançar ao fim do dia, como a roupa lavada, a terra cavada, a tarefa cumprida. Realizar, ou não, depende de nós e do nosso empenho em alcançar os objetivos e também das circunstancias que nos podem trazer imprevistos. Mas sabemos que o que não se alcançou hoje podemos conseguir amanhã, se nos empenharmos.
Uma coisa é bem clara no projeto de Jesus para nós. Quer dar ao ser humano a felicidade: Bem-Aventuranças.
As Bem-Aventuranças são o seu plano de atividades, o seu projeto com objetivo claro e tarefas claras com um fim imediato em vista – felizes na terra -, e um fim remoto e definitivo – felizes no Céu. Por isso, o texto das Bem-Aventuranças é a “Carta Magna do Reino dos Céus”.
Magno quer dizer grande, nobre, grandemente belo, ou seja, magnífico. Daí a palavra magnânimo, que aparece uma vez ou outra vez em textos da Bíblia. Alma Grande, coração grande… é nobre e belo, é generoso e cheio de amor. É aí que Jesus quer que cheguemos, deixando que Deus transforme o nosso coração de pedra em coração de carne. O seu contrário é o pusilânime, que é o homem tíbio, covarde, egoísta, pouco aberto e pouco empreendedor, preguiçoso, indolente. Isto já São Paulo apresenta como característica dos que fecham a si mesmos a porta do Reino de Deus.
Os que seguem Jesus devem aspirar a altos voos, que não são os do reconhecimento humano, mas o da realização da tarefa do existir que nos foi dado por Deus e de modo particular confiado a cada um de nós, no dia do nosso Batismo.
Por isso, a primeira tarefa é buscar a pobreza em espírito, a humildade a seguir e as lágrimas da conversão e da compaixão humana… “Felizes os que são pobres, os humildes e os que choram”. Sobe o nível do empenho em sermos misericordiosos, o que pode rondar a esfera da metafísica… E para ver a Deus, o que já é esfera da fé, pede-nos um coração puro, provado com obras de paz – os pacíficos. E então a luta do testemunho pela sede de justiça, pela perseguição e pela alegria de sermos herdeiros de algo novo, construtores da felicidade própria e alheia, fazendo do mundo um mundo novo.
Este é o desejo de Jesus para a humanidade… com promessas de recompensas que vão desde a consolação de quem se sente abrigado no coração de Deus à posse da terra de quem se sente seguro em si mesmo porque alicerçado Nele, até ao Reino dos Céus, reservado aos que merecem ser saciados até à plenitude, considerados Filhos de Deus, e, mais que senhores da criação, herdeiros do Reino dos Céus.
Entendemos que há muito para desenvolver nesta carta e, para tal, ela é colocada no início da pregação de Jesus. O Novo Testamento é o desenvolver de todo este projeto. Para assinar o nosso compromisso com esta carta, fomos batizados, mas, em cada dia, teremos de atualizá-la em nós com a perseverança do nosso “fiat”, “sim”, pelo qual nos assumimos missionários da felicidade e destinados à Bem-Aventurança Eterna. Por isso, o cristão é o maior beato que existe na face da terra. Esta palavra quer dizer “feliz”. E as pessoas que veem o nosso rosto e suas expressões, as nossas atitudes em obras e palavras, tanto podem sentir-se movidas e atraídas pela razão da nossa felicidade, como podem, ao nos sentirem incoerentes, chamar-nos beatos falsos. É por isso que esta palavra adquiriu nos nossos dias um sentido pejorativo. Pois, apesar de sermos chamados a ser beatos e nos esperar a visão beatífica, que significa uma felicidade sem fim, porque somos pusilânimes, damos ao mundo a triste figura de gente que reza, mas que não é feliz, pois vive na falta de autenticidade. Somos apelidados e justamente assim conhecidos, beatos falsos, no julgamento popular. É caso para pensar na magnanimidade da nossa missão e na pusilanimidade do nosso coração.
Vitor Espadilha