A viagem do Papa Francisco ao México está recheada de “provocações”, isto é, de pronúncias que põem o dedo na ferida dos desmandos da sociedade mexicana, infelizmente replicados em muitas outras sociedades, de todos os continentes. Só que, ali, o Santo Padre está no meio das situações concretas, palpáveis, extremas, desses desmandos.
A corrupção, o flagelo da droga, a riqueza injusta que gera caudais de pobreza, a marginalização das minorias étnicas, o culto da exclusão, o elevado índice de violência e crime…, são feridas profundas, que radicam essencialmente no menosprezo da dignidade de toda a pessoa humana. E o Bispo de Roma não se cansa de clamar que o respeito por essa dignidade é o fundamento de uma sociedade harmoniosa, de uma civilização digna desse nome.
É do respeito pelo direito humano fonte de todos os outros direitos – o direito à vida – que brotam todos os outros, para concretizar as condições de dignidade dessa mesma vida, desde o pão ao trabalho, desde a habitação à liberdade de consciência, desde a liberdade de crença à possibilidade de escolher um padrão educativo. E o respeito efetivo em todas as fases dessa vida, da geração ao termo dos dias deste mundo.
No nosso País, ergue-se agora a discussão sobre o “direito a morrer com dignidade”, o eufemismo para designar a eutanásia. Importa é perceber se não queremos privar os doentes de outros direitos, abafando-os com esse mito. Dizer “não há nada a fazer” é sentenciar morte prematura, é uma subtil forma de homicídio. Na verdade, como diz Laurinda Alves: “A finalidade da Medicina não é apenas curar doentes e doenças. Tão pouco se destina a cuidar especialmente de doenças agudas. A Medicina também serve para prevenir e controlar sintomas, em especial as dores dos doentes crónicos, progressivos e incuráveis. Existem tratamentos apropriados para este tipo de doentes, que sofrem de mil maneiras, sejam elas físicas, morais ou emocionais. É difícil aliviar muitos sofrimentos a muitos doentes, mas não é impossível minimizar as suas dores. Os médicos sabem isso. E os responsáveis pelo Sistema Nacional de Saúde também. Mas deviam saber mais: não existem para fazer apenas o que é fácil e tangível.”
A medicação, a proximidade, o carinho, podem transformar as situações insuportáveis, de desespero, em caminhos serenos – esses, sim! – para uma morte digna. A citada “paliativista” defende e pergunta é o que é que fazemos para que o sofrimento seja aceitável, para que os fins do caminho sejam uma despedida tranquila destes horizontes do espaço e do tempo. “Não há nada a fazer”? Há sempre muito a fazer, quando os doentes são reconhecidos como pessoas até ao fim.
Também Laurinda Alves coloca o dedo na ferida do comodismo, do utilitarismo, do vazio de amor, no acompanhamento e cuidado familiar, comunitário e médico de muitas situações, algumas das quais até se manifestaram recuperáveis.