“Os primeiros livros impressos em português tinham uma parte dedicada ao ensino da leitura e outra à doutrina”

P.e Belinquete

Depois de publicar a “História da Catequese”, o padre José Martins Belinquete dedicou seis anos à elaboração do livro “História do Ensino da Doutrina Cristã na Escola”, que vai ser apresentado no dia 13 de outubro. Nesta entrevista, o autor explica por que se abalançou a este trabalho e partilha com os leitores a carta que recebeu do Vaticano. 

 

CORREIO DO VOUGA – O que o levou a escrever esta “História do Ensino da Doutrina Cristã na Escola”, que será, sem dúvida, uma obra de referência nesta temática?
JOSÉ MARTINS BELINQUETE – Julguei que seria útil elaborar uma “História do Ensino da Doutrina Cristã na Escola”, dada a importância que a ação da Igreja exerce na Escola por meio das aulas de Educação Moral e Religiosa Católica (EMRC). É certo que, pelo estatuto que esta disciplina tem dentro do currículo escolar, não é uma disciplina de frequência obrigatória, mas faz parte integrante do mesmo. Não tenho conhecimento da percentagem de frequência a nível da nossa Diocese – esta depende muito do professor, com maior ou menor aceitação por parte dos alunos –, mas, nos últimos tempos, tem sido feito um notável investimento na melhoria dos programas, dos temas e dos textos, tornando-os mais atuais, mais agradáveis e de melhor qualidade na sua apresentação. Muitas pessoas têm trabalhado neles. O facto de, até agora, ninguém se ter abalançado a este trabalho mais me incentivou a fazê-lo.

 

Quantos anos dedicou a este livro?
Quando acabei a publicação da “História da Catequese”, em 2011, comecei a trabalhar neste livro com mais dedicação, sobretudo na pesquisa, na procura de elementos relativos aos primeiros séculos do cristianismo e da Idade Média, pois, quanto aos tempos mais próximos, já tinha bastante material, que, agora, era preciso organizar e trabalhar, o que significa que foram, contas redondas, meia dúzia de anos.
Quer destacar algum aspeto das suas investigações? Algo que considere especialmente relevante?
Refiro apenas o facto de as primeiras ‘escolas’ que ensinaram os portugueses a ler e a escrever serem de padres, bispos, monges ou frades, que, onde existiam, criavam à sua volta um grupo de pessoas às quais ensinavam a ler e a escrever. Realço ainda o facto de os primeiros livros impressos em português – as ‘cartinhas ou cartilhas’(1502; 1534) – terem uma primeira parte dedicada ao ensino/aprendizagem da leitura – letras, sílabas, etc. – e a segunda à doutrina.

 

O padre Belinquete já era autor da “História da Catequese”, obra que abordava a histórica da catequese em Portugal e nos países de língua portuguesa. Com este trabalho fica completa a história da educação católica em Portugal, ou há mais alguma área a investigar?
Quanto à modalidade de ensino da doutrina cristã, considero que estas duas modalidades (catequese e ensino na escola), em Portugal, são as principais; mas a Igreja ‘ensina’ também pela vida litúrgica e pela ação sócio-caritativa…

 

Recebeu uma carta do Papa, por meio do seu secretário, por causa da “História da Catequese”. O que lhe escreveu o Santo Padre?
A carta diz o seguinte: “Senhor Padre José, em acto de devota homenagem, teve a gentileza de oferecer ao Santo Padre uma ponderosa obra de investigação histórica sobre a catequese, de que foi coordenador e, em grande parte, autor. Para além de lhe significar que a mesma chegou às mãos do Sumo Pontífice, fui por ele incumbido de vir exprimir-lhe o seu reconhecimento tanto pelo delicado gesto de deferência pessoal, como sobretudo pelo serviço prestado à Santa Igreja ao abalançar-se a delinear a história da catequese no mundo da lusofonia. Bem haja, Padre Belinquete! E que Deus continue a dispensar-lhe as mais selectas graças para continuar, com a dedicação e o empenho demonstrados na obra recebida, a servir a causa da Igreja, contribuindo para o avanço da evangelização nos diversos países de língua oficial portuguesa em que estão postos, com viva esperança, os olhos do mundo e da Igreja, com o secreto augúrio de que, em breve, se tornem realidade as promessas que os seus insuspeitados recursos e a florescente juventude da sua população, em porfiado esforço por afirmar-se, justamente fundamentam. Tais são os votos que Sua Santidade o Papa Francisco exprime e deseja corroborar com uma benevolente e propiciadora Bênção Apostólica, que de todo o coração concede a Padre José Belinquete extensiva a quantos lhe são queridos e beneficiam do seu ministério sacerdotal. Aproveito o ensejo para lhe afirmar protestos de fraterna estima e grande consideração em Cristo Senhor. [Assina] Mons. Peter B. Wells – Assessor”.
Foi muito gratificante, como é evidente! Foi mesmo muito gratificante!

 

 

Uma vida dedicada à catequese e à religião na escola
O P.e José Martins Belinquete, 86 anos, atualmente colaborador do pároco de Ílhavo, tem muitas décadas de dedicação à catequese e ao “ensino da religião” na escola, mesmo antes de se ter licenciado em Teologia e tirado o mestrado em Pastoral Catequética no Instituto Católico de Paris, no início da década de 1970. Para referir apenas alguns aspetos nesta área, foi diretor dos secretariados diocesanos da Catequese (Infância e Adolescência) e da Educação Cristã para as Escolas Primárias de 1955 a 1986 e membro do Secretariado Nacional da Catequese nos anos 70. Para a catequese paroquial, foi co-autor com Amilcar Amaral dos catecismos “Nós queremos seguir-Vos, Senhor” (1979) e “A Caminho para o Senhor” (1974). Para a Educação Moral e Religiosa Católica, também com o mons. Amilcar Amaral, publicou “A Caminho do Futuro” (1978) e “Iluminai o meu caminho”, entre outros títulos.
Foi professor de EMRC na Escola Secundária de Homem Cristo (1975-76) e de Didática da EMRC na Escola do Magistério Primário de Aveiro (de 1974-75 a 1988-89) e no ISCRA (Instituto Superior de Ciências Religiosas de Aveiro). Publicou ainda diversos outros livros sobre a educação da fé.
Na década de 1980, fez parte do “Grupo Misto Igreja/Ministério da Educação”, incumbido de elaborar a legislação regulamentadora do Decreto-Lei que diz respeito ao ensino de religião e moral católicas nas Escolas Primárias, nas Escolas do Magistério Primário e nas destinadas à preparação e formação professores.

 

 

Apresentação da obra no dia 13 de outubro
O livro “História do Ensino da Doutrina Cristã na Escola” será apresentado no dia 13 de outubro, no CUFC (Centro Universitário Fé e Cultura), pelas 21h. A apresentação será feita pelo professor Sebastião Tavares de Pinho, da Universidade de Coimbra, e conta com um momento musical proporcionado pelo coro da Misericórdia de Ílhavo.