Repartição de rendimentos descurada

Acácio F. Catarino
Sociólogo, Consultor Social

A repartição de rendimentos mais justa contribui para a redução das desigualdades sociais alforadas no penúltimo artigo. Desde os anos sessenta do século passado, a repartição de rendimentos foi objeto de estudo sistemático e de propostas várias, no antigo Fundo de Desenvolvimento da Mão-de-Obra e, depois, no organismo de estudos e planeamento do ministério responsável pelo trabalho e segurança social; a notável equipa de economistas que se ocupou do assunto foi coordenada pelos Drs. João Pereira de Moura e M. Odete Esteves de Carvalho. Depois de Abril de 74, descurou-se bastante esta preocupação devido, em parte, ao facto de se confiar mais nos dinamismos da revolução e das lutas político-laborais.
Há que distinguir a repartição funcional da pessoal: a primeira considera os rendimentos do trabalho, por um lado, e os do capital, por outro; a segunda considera os diferentes níveis de rendimento das pessoas. Sabe-se que, ultimamente, os rendimentos do trabalho têm diminuído em relação aos do capital; e sabe-se também que têm aumentado as desigualdades entre as pessoas. Para aquela diminuição, contribuem fortemente a competividade interna e externa, bem como o progresso tecnológico muito exigente em novos investimentos; para as desigualdades entre as pessoas contribuem essa mesma diminuição bem como as diferenças de salários, a riqueza herdada, as oportunidades de ganhar muito dinheiro, os ganhos ilegítimos, o desemprego, os encargos familiares, as doenças, as mortes… Constituem desigualdades particularmente contestadas, hoje em dia, as diferenças entre os salários muito altos e os mais baixos, a par dos elevados ganhos do capital em contraste com os do trabalho; e, paradoxalmente, esta última desigualdade até parece tender para aumentar, «necessariamente», atendendo à descapitalização de muitas empresas. (Continua)