Um país pintado a cor de rosa

FLAUSINO SILVA
Empresário

No seu estilo de Presidente dos afetos – que vai a todas, que comenta tudo, que tira selfies e dá muitos beijinhos – o Professor Marcelo pinta aos portugueses um país cor de rosa, mostrando-nos o lado positivo da situação, passando por cima das mazelas profundas e amaciando-as com o seu conhecido génio de comentador.
Na sua primeira mensagem de Ano Novo, pintou exatamente o quadro que descrevemos: iniciamos o ano de 2016 em sobressalto, com expetativas negativas muito altas, mas que foi atravessado com aparente sucesso, em aparente calmaria, sem convulsões graves, com o Presidente, qual chairman governativo, a gerir o equilíbrio político instável resultante da geringonça: houve recuperação de rendimentos, aprovação de Bruxelas às propostas para o sistema financeiro e para o orçamento de 2017.
Claro que muitos portugueses continuaram a ter de ir às cinco horas da manhã para ganhar vez nas consultas dos centros de saúde congestionados e sem médicos (o senhor Presidente apelou para que acorressem primeiro aos centros de saúde e não aos hospitais), espera-se meses pela justiça, há escolas sem segurança e sem pessoal, etc. etc. mas são minudências que não chegam para toldar a beleza da decoração governativa.
O barco aguentou-se na viagem, em aparente calmaria, metendo, contudo, cada vez mais água. Na prática, afundando o país sem darmos por isso. Senão vejamos: o investimento baixou 25%, as exportações diminuíram, o endividamento mantém-se elevadíssimo (a dívida emitida pelo IGCP tinha, no final de outubro de 2016, o valor de 236.774.835.815€, cerca de 129% do PIB-Produto Interno Bruto), acarretando juros de mais de oito mil milhões de euros em 2017 e o PIB cresceu abaixo do previsto e menos do que em 2015, quando a Troika se foi embora.
Mas o senhor Presidente da República advertiu o governo, na sua mensagem, de que para 2017 é preciso fazer uma gestão, não do imediato, como em 2016, mas a prazo (… 2016 foi o ano da gestão do imediato, da estabilização política e da preocupação com o rigor financeiro. 2017 tem de ser o ano da gestão a prazo, e da definição e execução de uma estratégia de crescimento económico sustentado…).
Mas o ano de 2017 já está programado – o senhor Presidente promulgou o Orçamento de Estado, que define o plano, as estratégias e as políticas e nele o crescimento previsto é de 1,5%, idêntico ao de 2015 e muito pouco acima de 2016. Como é que, com este crescimento, pode haver melhoria sustentada da vida dos portugueses, com o endividamento a manter-se e os juros da dívida a aumentarem?
Se os juros da dívida aumentam, o que os credores pensam do país é que o risco é muito elevado e que a confiança é reduzida, ao contrário do que o senhor Presidente diz na sua mensagem.
Nós gostamos muito de ter um Presidente que esteja próximo dos portugueses, mas queremos que a sua proximidade não signifique apenas afetividade, mas que nos defenda das más práticas governativas, que exija o cumprimento das promessas de crescimento económico, da redução dos impostos, que se mantém praticamente ao mesmo nível de 2016 – 34,1% do PIB.
Afinal, o que o governo diz restituir em rendimentos aos cidadãos, retira-lho através dos impostos, sobretudo dos impostos indiretos.
Senhor Presidente, os portugueses elegeram-no para ser o Supremo Magistrado da Nação, velando pela equidade e justiça da governação.
É isso que todos queremos e esperamos no Novo Ano que ora começa!