Acolher, proteger, promover e integrar migrantes e refugiados – um compromisso para os pactos globais
Na mensagem para o Dia Mundial do Migrante e do Refugiado de 2018, que ocorreu a 14 de janeiro, o Papa Francisco pedia à Igreja e à sociedade civil para desenvolver uma ação clara em prol dos migrantes, refugiados e vítimas de tráfico humano. Pedia também aos Estados membros da ONU, empenhados num Pacto Global, que enfrentassem a questão migratória, propondo medidas de acolhimento, de proteção, de promoção e de integração destes irmãos nossos que batem às nossas portas, fugidos à fome, à guerra e à perseguição.
Mas, antes de tudo, é necessário admitir o princípio da mobilidade como uma das características das sociedades modernas e integrá-la na legislação de cada país, para que isso aconteça de modo ordenado, legal e seguro.
Temos conhecimento que em Portugal muitas empresas cumprem as suas obrigações sociais com trabalhadores estrangeiros, mas não podemos ficar insensíveis a alguns atropelos que acontecem não apenas noutros países, mas também no nosso, como o trabalho sazonal, sobretudo na agricultura, realizado por pessoas de outras origens e culturas, sem lhes reconhecer os direitos a trabalho humano, remuneração justa, habitação digna, alimentação capaz, segurança social e saúde pública. Ainda pior quando são vítimas de intermediários sem consciência, que lhes confiscam os documentos, parte do salário e ameaçam os seus familiares nos países de proveniência. Algo semelhante acontece com ‘empresas’ que recrutam mão-de-obra em Portugal para trabalhar no estrangeiro, prometendo condições vantajosas que depois não se verificam.
Acerca dos migrantes e refugiados, não podemos deixar de salientar o esforço que tem sido desenvolvido em Portugal no sentido de maior capacidade de acolhimento. É de realçar todo o trabalho desenvolvido pela PAR – Plataforma de Apoio aos Refugiados. Todavia, com base nas quatro ações sugeridas (acolhimento, proteção, promoção e integração), propomos algumas medidas viáveis para ajudar a solucionar este problema global do nosso tempo.
- Acolher em vez de devolver.
Sendo a mobilidade humana um fenómeno que caracteriza o nosso tempo e as nossas sociedades multiculturais e inter-religiosas, deverão os nossos responsáveis políticos, como os de outros Estados, procurar responder a este fenómeno, criando para isso legislação adequada para o seu acolhimento justo e digno, em vez de fecharem as fronteiras da Europa e devolverem estas pessoas a países terceiros, que, por sua vez, os repatriam para os seus países de origem, pobres e, muitas vezes, atingidos pela corrupção e pela guerra. Criar, para isso, corredores humanitários seguros, para evitar que sejam vítimas do tráfico de máfias sem escrúpulos, a quem unicamente interessa o dinheiro.
- Proteger e não apenas socorrer.
Muitas destas pessoas, esfomeadas, violadas e feridas, depois de um longo e penoso caminho por mares, desertos e montanhas, chegam até nós carentes de afeto e proteção, sobretudo os menores e as crianças sem familiares. Em conformidade com a Convenção Internacional dos Direitos da Criança, devem ser protegidas e defendidas, com acesso a cuidados de saúde e educação, de modo a que possam crescer e ter o amparo humano de que necessitam.
- Promover em vez de abandonar.
Os migrantes, os refugiados e as vítimas de tráfico humano devem ser apoiados de modo a que, conscientes dos seus direitos e deveres, se desenvolvam como pessoas reconhecidas na sua dignidade e situação de vida particular, participando ativamente na vida local, de modo a poderem dar o seu contributo pessoal e comunitário aos países onde vivem, sem esquecerem as suas origens, a cultura e o bem-estar dos seus familiares.
- Integrar em vez de empurrar para guetos.
Os migrantes contribuem para o desenvolvimento global, não apenas enquanto mão-de-obra produtiva, mas enquanto pessoas com um ‘capital’ de experiência de vida, riqueza cultural, religião, língua e costumes. Por isso precisamos de fomentar uma cultura de encontro e de diálogo, de modo a enriquecermo-nos mutuamente, em vez de os empurrar para guetos linguísticos, de culto, de etnias ou de cor, contribuindo para aumentar os focos de tensão e conflito, impedindo-os de se tornarem membros e cidadãos de pleno direito das nossas sociedades e comunidades.
É um longo e complexo processo, já em curso também em Portugal, mas será o único capaz de fazer do fenómeno da mobilidade um fator de enriquecimento harmónico do mundo global em que vivemos, tornando os nossos ambientes, marcados pela mobilidade, mais pacíficos, dialogantes e integradores.
Confiamos na boa vontade e no sentido de justiça dos nossos legisladores e fazemos apelo aos responsáveis do Governo a que continuem a desenvolver medidas de acolhimento e integração dos migrantes, dos refugiados e das vítimas do tráfico humano e partilhem as boas práticas com os outros países no âmbito das Nações Unidas, para que o Pacto Global sobre as migrações internacionais e sobre os refugiados seja um enriquecimento para todo o mundo e assim se integre a mobilidade na realidade das nossas sociedades.
Esperamos também que na sociedade, nas instituições e nas comunidades cristãs das nossas Dioceses portuguesas se cultive o amor generoso que se traduza em acolhimento, proteção, promoção e integração dos que buscam, com verdade, sentido para a vida.
Fátima, 12 de abril de 2018