Lições, reconhecimento

Muitas vezes estas linhas são dedicadas a tantas injustiças que tão frequentemente são cometidas contra as pessoas e as populações ciganas. Hoje queríamos levantar esta voz para condenar os crimes hediondos que foram cometidos em janeiro contra profissionais de saúde no Hospital de Famalicão e particularmente para exortar as Associações de ciganos a atuar e a levantar a voz para que lamentáveis situações como estas não só não se repitam, como não seja possível que o enquadramento em que ocorreram possa voltar a provocá-las. Infelizmente só existe atualmente em Portugal um mediador hospitalar cigano, no Hospital de D. Estefânia em Lisboa.

Recentemente, o signatário teve oportunidade de ser telemediador, num dos hospitais mais dramáticos, onde um cigano ia ser submetido a uma intervenção cirúrgica. Um dos valores mais exemplares da maneira de ser cigana, é o espírito de família que leva as famílias a mobilizarem-se para que o doente não se sinta sozinho: todos acompanham o doente para que este se sinta apoiado. Neste caso, o perigo era grande para o doente e, consequentemente, a ansiedade, justificada, era muita. O que foi necessário fazer, foi explicar que os procedimentos que o hospital seguiu foram, naturalmente, os corretos e que são aplicados em todos os casos semelhantes. Esta explicação foi acatada. Contrariamente à expetativa mais ansiosa, o final foi feliz e o doente regressou curado a casa e aos seus.

Tantas vezes nestas linhas se exortam as autoridades no sentido de implementarem medidas que concretizem na prática as boas intenções dos legisladores dos direitos humanos. É necessário hoje formular um especial reconhecimento à Secretaria de Estado para a Cidadania e Igualdade (entretanto extinta) por, recentemente, ter evitado que (mais) uma família cigana fosse desalojada coercivamente do acampamento em que sobrevivia. Infelizmente o destino desta família não foi um realojamento, mas continuar à deriva, de terra em terra de expulsão em expulsão, até que um legislador verdadeiramente humano decida revogar as posturas municipais que dão cobertura legal  às Câmaras que querem ganhar votos à custa da desumanidade de franjas da nossa população e às forças da ordem a quem, não duvido, individualmente, repugnará cumprir tais ordens, mas que se sentirão obrigadas a cumpri-las. No caso descrito, a Secretaria de Estado conseguiu que prevalecesse a humanidade, para não dizer o direito.

Francisco Monteiro