FERNANDO MOITAL

Após uma curta mas fatal crise de saúde, Fernando Moital, o apóstolo dos ciganos nómadas compulsivos do Alentejo, faleceu em 20 de setembro. Referindo as múltiplas reações nas redes socias sobre a vida de Fernando Moital, a sua mulher diz que elas “mostram bem o ser humano que ele era, o trabalho que desenvolveu ao longo dos anos em prol da comunidade em geral, escolar, comunidade cigana.

Era um amante da natureza e muito sensível às questões da mobilidade e ambientais.

O Fernando tinha um coração grandioso e o dom de criar laços de amizade e criar sinergias na luta pelas suas convicções.”

Fernando Moital, movido pelo seu próprio coração, pelo seu exemplar sentido de cidadania e pela sua profunda humanidade, não pôde passar ao largo dos ciganos cuja única solução de sobrevivência é vaguear constantemente de terra em terra, rompendo violentamente a escolarização das suas crianças e a sua ligação às instituições de saúde e à segurança social,  por não terem meios para possuírem uma casa onde se albergar ou um terreno onde se fixarem, sendo, por esse motivo, sistemática e tantas vezes barbaramente escorraçados pelas chamadas forças da autoridade (que autoridade?: a da injustiça?, a do desprezo pelos direitos humanos e pelas leis que dão a cada cidadão o direito a ter uma habitação condigna?), a mando de Câmaras Municipais que trocam as respetivas supostas ideologias de defensoras da sociedade e do povo, por punhados de votos, ao abrigo tão zeloso quanto hipócrita de posturas municipais, que se este país fosse digno de ser considerado uma nação de bem, há muito teriam sido revogadas.

Fernando Moital não era Governo, não era Autarquia: Fernando Moital, era, como ele próprio assinou, no mail publicado na última Caravana (nº 105, cuja primeira página lhe foi dedicada), pai e cidadão. Fernando Moital não ignorou a desumana sina dos seus amigos ciganos nómadas compulsivos, não teorizou sobre eles, não fez projetos nem se limitou a boas intenções: Fernando Moital conhecia as famílias ciganas nómadas compulsivas  pelos seus nomes, sabia as suas idades, acompanhou-as nas suas imensas vicissitudes, defendeu-as perante as autoridades, facultou-lhes a sua caixa de correio, única maneira que a lei lhes impunha para terem acesso a… existirem como pessoas, face à burocracia existente.

Os sem abrigo têm, e ainda bem, um horizonte temporal para a solução das suas dramáticas situações, os ciganos nómadas compulsivos não têm: quem os considera a nível estatal? Os imigrantes têm, e ainda bem, a mobilização organizada para os acolher e acompanhar: quem se mobilizou para sequer olhar, ouvir, fazer-se eco das violências que são repetidamente infligidas aos nómadas compulsivos?  Fernando Moital.

Fernando, onde estás, pede a Deus que faça o milagre de alguém nesta terra abençoada pela sua Mãe, continuar a tua obra.

Francisco Monteiro