HABITAÇÃO PARA AS FAMÍLIAS CIGANAS
Continuação e conclusão dos excertos do nº de dezembro da Newsletter do OBCIG (Observatório das Comunidades Ciganas) dedicado ao “Direito à Habitação”, iniciados no nº 107 da Caravana
Osvaldo Grilo, Associação Cultural e Recreativa de Coimbra sintetiza assim a situação habitacional no país:
“Desde o Baixo Alentejo ao Alto Alentejo, passa pela zona Sul, passa pela zona Norte. Se formos a ver ao nível [nacional], temos mais de 200 ou 300 acampamentos. Há ciganos itinerantes, que têm que fazer um percurso desde o Alentejo, Algarve, fazem uma trajetória durante o ano porque não lhes dão residência em pleno séc. XXI. Algumas Juntas de Freguesia ajudam… É que eles nem direito a subsídio têm, só têm direito ao SNS. Em pleno no séc. XXI. Estamos a falar de pessoas com nacionalidade portuguesa. Se vamos falar de outros pontos… Beja, B.º das Pedreiras, aquele degredo que está ali e toda a gente sabe. Aquele muro que já mandámos abaixo. Já foram queixas a nível europeu, foram condenados. Chamam-lhe “o cemitério vivo”. Há tanta coisa para dizer. No Norte… Desde Espinho até Barcelos, eu tenho mais de 50 acampamentos, ou 60. Pessoas a viver em condições que não lembra… A gente vê hoje em dia a Ucrânia, vê os refugiados… Eles [nos acampamentos ciganos em Portugal] estão em condições precárias, mesmo sem condições nenhumas. Lama… Quando chove então, não há ninguém que consiga lá ir. Se alguém fica doente de um momento para o outro, para sair, ou uma criança… Não conseguem sair de lá porque não têm condições nenhumas, as estradas, a lama, estão no meio dos montes… É uma coisa absurda. Tinha que se investir mais, tinha que se fazer melhor planeamento. Porque o planeamento que foi feito… A partir de 2016/2018 abriu-se uma Secretaria de Estado para a Habitação. O apanhado que ela tem é de 20.000 agregados a necessitar de habitação para serem realojados, mas é o dobro, são mais de 40.000 que não estão englobados nesta estratégia nacional para o realojamento ou para a habitação. Segundo os números que conheço. É como eu digo, tenho que ser positivo e lutar. Mas o nosso governo central também tem que fazer um pouco de força, pressionar mais um pouco o governo local. Porque são coisas independentes. Eu sei bem como funcionam as coisas, cada um tem o seu poder, eles dão as diretrizes, mas ou eles fazem ou eles não fazem. E vamos ver o que é que vamos ter daqui para a frente. Espero bem que este ano seja um ano de prosperidade, vamos prosperar. Mas duvido muito. Aqui em Coimbra, se forem realojadas dez famílias, vai ser muito. Daquelas 50 que estão a precisar.”
“De há 5 anos para cá, existem muitos reclusos ou ex-reclusos que saíram e foram-lhes retiradas as suas habitações. Não sei se há um regulamento interno da Câmara de Coimbra, que é um poder local, além de seguirem as diretrizes do governo central. Tenho em frente à associação 6 roulottes e mais 4 roulottes atrás sem condições nenhumas. Depois temos mais dois acampamentos nas pontas da cidade. No total, temos 25 agregados (e cada agregado tem umas 8 a 10 pessoas) a precisar de uma habitação, e com condições muito muito complicadas: a nível de água, a higiene pessoal (nem sei como é que a fazem). Está muito complicado. E estão mesmo no centro da cidade, porque o planalto do Ingote atualmente é o centro. Aqui passa tudo. “
“Há muitas famílias em habitação social. Porque as pessoas não têm condições…Dizem que há falta de vontade da comunidade cigana sair dos bairros sociais. Não, não deixam é os ciganos saírem dos bairros sociais. Porque vamos para qualquer sítio para arrendar, mesmo com recibos, pessoas que trabalham, pedem imensas coisas, recibos, IRS, as pessoas têm, são jovens, querem independência, querem sair dos agregados que estão sobrelotados. E não têm condições porque chegam aos sítios ou vão a uma imobiliária e a casa já está alugada. Eles dizem “sim, senhor, venha, traga os papéis que esta casa fica guardada para si”. E chegam lá e, se repararem que são ciganos, telefonam ou dizem que já não é possível ser alugada porque já foi alugada a outra pessoa e antes não sabia. Depois pedem imensas desculpas, “vamos tentar arranjar outra”. Se for diretamente com o senhorio, e o senhorio vir que é cigano, já não aluga.
“Há pessoas que fizeram o pedido para uma habitação camarária e já estão à espera há 10 anos. … Já se pediu à Câmara Municipal de Coimbra para intervir diretamente com os senhorios ou com as imobiliárias para haver um compromisso, fazer de mediação, para essas pessoas poderem arrendar uma casa, e nunca se conseguiu nada. Era uma das hipóteses com que se podia trabalhar. Mas nunca foi essa a vontade.”
“Nestes últimos 10 anos, houve um retrocesso muto grande ao nível da habitação. … Aqui em Coimbra, acho que são 500 agregados familiares, ciganos e não ciganos, à espera de habitação camarária. E eles dizem que a prioridade não é só a comunidade cigana. E eu entendo isso. É claro que toda a gente necessita [de habitação]. Até vamos pela nossa Constituição, pelo Artigo 65.º, 33 . “Se alguém tiver um familiar, não pode passar um fim de semana numa habitação social sem os avisar, se não podem ser punidos. Eu não posso receber ninguém em casa. Há uma série de regras e critérios mesmo para afastar as pessoas. Isto, para as pessoas que estão menos informadas, faz muita confusão. E para as pessoas mais idosas. Por exemplo, tenho a minha mãe com 77 anos, vem um neto e não pode passar um fim de semana. Isto é um exemplo. Há várias pessoas assim, que dizem “ai não podes vir que vêm aí as senhoras e depois fazem um problema, e podem tirar-me a casa”. Acho que isto é mais um modo de intimidar as pessoas, e um aproveitamento da fragilidade e das pessoas não estarem tão bem informadas. Isto para mim é um abuso.”
“Ainda não realojaram ninguém. A Estratégia Local de Habitação ainda está para ser lançada. Era para ser este ano, mas acho que é para o próximo ano. Foram dois anos muito complicados para todos nós. Para terem uma noção, durante dois anos não houve um atendimento. Mesmo depois das restrições, ainda hoje, para ter um atendimento… Um atendimento marcado para o Departamento de Habitação, tem uma margem de 3 a 5 meses. É uma coisa absurda. E, mesmo assim, não atendem. Podem marcar, e depois desmarcam, não podem. O Covid agora serve de desculpa para tudo. Teve influência para certas coisas, mas não para tudo. Eu não tive acesso a essa documentação nem à Estratégia Local. Aquilo que me apercebo é que vão ser realojadas várias famílias, estão a requalificar vários fogos que também não tinham condições de habitação, e espera-se que vão ser realojadas algumas famílias. Não muitas, mas vão. E espero bem que sim, que isto é um crime.”
“Ainda não realojaram ninguém. A Estratégia Local de Habitação ainda está para ser lançada. Era para ser este ano, mas acho que é para o próximo ano. Foram dois anos muito complicados para todos nós. Para terem uma noção, durante dois anos não houve um atendimento. Mesmo depois das restrições, ainda hoje, para ter um atendimento… Um atendimento marcado para o Departamento de Habitação, tem uma margem de 3 a 5 meses. É uma coisa absurda. E, mesmo assim, não atendem. Podem marcar, e depois desmarcam, não podem. O Covid agora serve de desculpa para tudo. Teve influência para certas coisas, mas não para tudo. Eu não tive acesso a essa documentação nem à Estratégia Local. Aquilo que me apercebo é que vão ser realojadas várias famílias, estão a requalificar vários fogos que também não tinham condições de habitação, e espera-se que vão ser realojadas algumas famílias. Não muitas, mas vão. E espero bem que sim, que isto é um crime.” “No município de Coimbra … a única coisa que eu queria que eles mudassem é que vissem realmente e estivessem mais próximo da pessoa que necessita, de quem lá vai e vai fazer um pedido de habitação camarária (…) Têm que mudar os métodos de avaliação.”