Amor à Igreja

“Amou a Igreja”. Esta frase está sobre a sepultura do padre José Kentenich, em Vallendar, Alemanha. Santa Teresa de Jesus, ao morrer, disse: “Por fim, morro filha da Igreja”. E o mesmo poderíamos dizer de todos os santos. Cada um deles teve uma expressão verbal ou gestual desse amor que fez com que morressem no seio da Igreja. Uma Igreja que abre as suas portas e fronteiras para um mundo ecuménico e inter-religioso, de modo encantador para os de mente aberta ao sopro do Espírito, ao vermos a visita do Papa Francisco ao Médio Oriente.
Se me permitem a minha opinião, parece-me a mais intensa de todas as visitas realizadas por todos os Papas. O Papa que quebra protocolos humanos para levar um muçulmano a rezar com ele no Muro das Lamentações, ou um judeu à mesquita muçulmana, e que caminha por terras de fogo sem carro blindado, e beija o muro que separa Israel da Palestina, e não entra no sepulcro antes do Patriarca de Constantinopla, mas detem-se, para que este entre primeiro, quando a Bíblia nos disse que João não entrou antes que entrasse Pedro. Que disse que o ministério petrino tinha de ser colegial e que Pedro não pode governar sozinho… Meu Deus, que alegria, o nosso tempo. Pensava que tinha visto tudo com João Paulo II ou ouvido maravilhas com Bento XVI e agora o Francisco move-nos como o de Assis moveu, na sua pobreza, a Igreja do seu tempo.
Dou graças a Deus pela Igreja que somos. Mas, o Padre Kentenich e Santa Teresa não revelam o seu amor só porque a Igreja do seu tempo os entusiasmava assim. O amor deles à Igreja não nasce do entusiasmo de ver o êxito. Não caíram na tentação dos Apóstolos, que diante do fracasso da Cruz fugiram… P.e Kentenich foi exilado nos EUA, pela própria Igreja, durante 14 anos. E Santa Teresa esteve em vias de cair na fogueira da Inquisição, por causa das suas ideias de reforma. A prudência da Igreja, como Mãe, leva a tomar decisões que podem parecer absurdas, e exige das pessoas implicadas a grande prova da obediência… E os dois obedeceram, certos de que Deus está na sua Igreja.
Há dias, um padre dizia numa homilia que ouvi com prazer que os dons de Deus, os seus carismas, saem sempre perfeitos das mãos de Deus. Ao chegar às nossas mãos tornam-se imperfeitos, e isso porque não somos obra acabada. Por isso, o bispo diz ao padre no dia de sua ordenação que o que Deus que nele começou, a Obra Boa, Ele mesmo a leve a bom termo. Amar a Igreja é aceitá-la assim, imperfeita, a caminho, sem deixar ela de ser caminho. Por isso, os cristãos aspiram à perfeição ou santidade, mas não podemos ser perfecionistas. O perfecionismo é uma forma velada de egoísmo.
Quando eu era seminarista, visitou o meu seminário o Papa João Paulo II. Alguns foram escolhidos para comungar das mãos do Papa. O meu colega escolhido contou que, quando chegou a sua vez, disse: “Eu creio, Senhor, agora eu creio”. Nunca esqueci esta frase que entendi que era devida à emoção de comungar da mão do Papa que hoje é santo, mas sempre pensei que dizer isso ali, com aquela intensidade, pode ser enganoso. Pois temos de o dizer mesmo na mais remota das igrejinhas bolorentas do mundo, diante do Senhor, na Eucaristia e na vida.
Se nos momentos de uma visita papal, indiscutivelmente maravilhosos, a fé parece que aumenta, não podemos esquecer que mais importante do que estar com o Papa é estar com Jesus.
Não sei se o faria hoje, mas quando o Papa se encontrou com os seminaristas de Espanha, onde eu estudava, e o encontro seria na cidade de Valência, eu fui um dos sorteados. Mas um colega meu, peruano, quase morria se não ia. Dei-lhe o meu bilhete e fiquei aquele dia com Jesus no sacrário. O colega ficou feliz, pois esteve com o Papa pessoalmente a representar o meu seminário de Toledo… Eu estive sozinho com Jesus, e a paz que senti naquele domingo não a trocaria por nada neste mundo. Claro que os meus colegas, um e outro, são padres maravilhosos. Mas sei que, como dizia Faustina Kowalska, a obediência e o amor pela Igreja nos levam não só a aceitá-la e vibrar com seus êxitos e coisas lindas, mas também a aceitar os seus defeitos de imperfeição, e sobretudo, a viver esse amor, quando ela exige de nós a obediência, por vezes no absurdo, com confiança, como Teresa e José Kentenich.
Vitor Espadilha