Livro: Nossa Senhora da Rússia

A Mensagem de Fátima na Rússia
José Milhazes
Alêtheia
188 páginas
13,90 euros

 

 

Ícone de Nossa Senhora de Fátima numa igreja católica de São Petersburgo. A imagem foi pintada segundo as regras dos ícones
Ícone de Nossa Senhora de Fátima numa igreja católica de São Petersburgo. A imagem foi pintada segundo as regras dos ícones

2017 é o ano de dois centenários: o das Aparições de Fátima e o da revolução comunista na Rússia, dois acontecimentos nos extremos do continente europeu que marcaram o século XX e continuam a marcar a atualidade. Extremidades geográficas e também ideológicas, como explica José Milhazes: “Acontecimentos situados em pólos ideológicos e filosóficos contrários deram origem a forças que acabaram por se cruzar e se envolver num combate de vida ou de morte no turbilhão que constitui o século XX”.
Escrito por alguém que conhece bem a realidade portuguesa (o autor nasceu na Póvoa do Varzim em 1958 e doutorou-se na Faculdade de Letras da Universidade do Porto em 2007) e soviética (licenciou-se em História da Rússia pela Universidade de Moscovo em 1984), este livro começa de forma magistral revelando um poema soviético de 1925 intitulado “Canção Açoriana”. Iossif Utkin imaginava no final do seu poema que “Muitos amigos meus sofreram / Nos combates, e não em palavras,/ Para que nas Ilhas dos Açores, / moças cantem como comunistas”. Porém, escreve Milhazes, “a cavalaria vermelha não chegou às Ilhas dos Açores, nem os bolcheviques conseguiram pôr fim à fé religiosa”. Pelo contrário, nas prisões estalinistas, Alexandre Soljenitzin observava como os católicos lituanos faziam rosários à mão. As contas eram feitas de pão molhado que, depois de pintadas de preto com o fumo de borracha queimada, eram deixadas a secar na janela. E o Nobel da Paz de 1970 também quis ter um terço.
Mais do que o assunto de Fátima na União Soviética, que é diretamente abordado no capítulo II, este livro fala do cristianismo na Rússia no último século. O primeiro capítulo responde à pergunta: “Para quando a união das duas Igrejas irmãs?” O terceiro e o quarto retratam a perseguição religiosa durante o regime soviético (1917-1991). O quinto volta a pegar no assunto Fátima e relaciona-o com o famoso ícone da Mãe de Deus de Kazan. O sexto e último fala de um “encontro inesperado em lugar exótico”. Trata-se do encontro do Papa com o Patriarca de Moscovo, em Havana (Cuba), no dia 12 de fevereiro de 2016. “(…)Será que o encontro de Francisco e Kirill não foi um importante sinal de que o muro que divide ortodoxos e católicos já começou a apresentar largas brechas?” A pergunta encerra o livro.

J.P.F.