Poço de Jacob – 190
Chegou num 8 de dezembro. A novidade de vermos um novo bispo, depois de duas décadas, encheu-nos de curiosidade. O seu ar simples, delicado, simpático cativou-nos logo, pela aparência. Os seus braços abertos para nos agradecer os aplausos deu-nos a sensação que nos acolhia a todos. Cada um pensou em ter lugar nesse coração e em como fazer para o conseguir pessoalmente, sem interesses, sem pretensões. Éramos pequeno rebanho a querer aconchego. E o bispo é o chefe de uma Igreja Diocesana, ele é o que tem o único altar a partir do qual todos os altares “funcionam”.
Foi amor à primeira vista. E ao longo de oito anos houve encontros e desencontros, próprios da vida. Houve desmistificação da figura e apreciação da personalidade. Houve críticas das ações ou falta delas e colaboração generosa de ambas as partes para a edificação de uma Igreja que se pretende una e unida como ele sempre quis. Trazia uma preocupação: Vocações. Um amor: Maria que nos dá Jesus. Ela nunca faltou nas suas homilias. Trazia um interesse: Ser irmão de toda a gente. Um voto: Estar ao lado de cada padre. Também dos doentes e dos menos favorecidos. Acostumou-nos aos seus intermináveis e sinceros obrigados, mostrando uma humildade surpreendente, como quem sempre recebe de cada um, sem ter em conta o muito que nos dava. Ouviu quem quis falar. Ligava pouco a e-mails ou telefones, sempre ansioso por atender tudo e todos, atropelando horários e pontualidade, como um pai que tem muitos filhos e quer atender a todos. Incansável… nunca impaciente. Dialogante, estando inteiro em cada coisa e momento e diante de cada pessoa sem pressas, e sem se lembrar do compromisso a seguir.
Um dia, um pobre dormia no banco da entrada da Casa Episcopal. Levou-o para dentro e deu-lhe comida, cama, sem medo de ser roubado. Era Cristo que ali estava. “Eu não podia mandá-lo embora”, disse, quando o alertaram para a imprudência. A Caridade era o seu motor. Vivia só de Amor. E a Missão Jubilar foi expressão da sua personalidade. Não nos deixa grandes discursos. Nem grandes obras, para além da grandiosa Casa Sacerdotal e dos estímulos que deu a cada um para realizar as obras que depois inaugurou. Sem esse estímulo, algumas não teriam sido acabadas ou realizadas.
Deixa-nos um contágio: sem nos darmos conta, começamos a fazer do amor e do acolhimento a nossa maneira espontânea de ser e agir. Ele contagiou-nos de amor. Revimos muitas das nossas atitudes. Mudámos muitos dos nossos caminhos. Endireitámos veredas tortuosas. Mais uns anos connosco e Aveiro seria a Diocese do Amor Maior. Espero que não esqueçamos essa lição.
Quando veio o Papa Francisco e a todos nos interpelou nesse amor, Aveiro não viu novidade. Já o víamos no nosso bispo, Pai e Pastor. Agora a Cidade da Virgem o chama. E lá vai ele nas asas do vento, no abandono da criança que se deixa guiar. Temos pena… e não temos, pois é assim que voam os santos, sem amarras nem prisões. Mais uma lição que deixou bem expressa na sua carta, sublime carta, de despedida. Sempre o amaremos. Sempre nos amará… E temos novo bispo para acolher e amar muito, sem cair no pecado que ofende e magoa, das comparações: O outro era melhor!
Obrigado, D. António. Não ficamos com saudades irremediáveis, pois vamos visitá-lo ali ao lado, ao Porto. Ficamos é a olhar para o Porto como criança que teve de dar o brinquedo ao outro, desculpe a comparação do brinquedo. Peça por nós e pelo seu sucessor. Ame muito esse lindo Porto. Deixe-se amar que o Porto ama muito, carago! E leve a certeza de que sua passagem por nós, sem desfazer nos queridos bispos que o precederam, foi a primavera que Aveiro precisava para crescer, jovem e feliz, no Amor.
Abençoe-nos e leve o nosso coração ao seu lado, na garantia de que sempre rezaremos por si… Obrigado, Senhor Deus… E guia os seus passos nos caminhos da força e do amor que conduz ao Céu.
Parabéns, Porto. Cuida bem dele, pois estaremos atentos.
Vitor Espadilha