A Igreja evangeliza com a beleza da liturgia?

Os desafios programáticos inscritos pelo Papa Francisco na Evangelii Gaudium, em particular o de uma comunidade a “primeirear”, e a sua afirmação que «a Igreja evangeliza e se evangeliza com a beleza da liturgia» (n.º 24) motivaram a Conferência Episcopal Italiana e a Pontifícia Universidade Gregoriana a organizar um congresso intitulado “Liturgia e Evangelização. A Igreja evangeliza com a beleza da liturgia”, que decorreu em Roma entre os dias 25 e 27 de fevereiro passados. O programa permitiu diferentes abordagens do tema, que partiram da filosofia, da antropologia, da estética e da pastoral.
A prioridade lógica e teológica da evangelização em relação à liturgia não a limita, antes potencia o seu lugar de ação de Cristo salvador na vida da comunidade dos crentes através dos gestos e palavras que, de forma indutiva, levam os crentes a penetrarem no mistério. Deste modo que lhe é próprio, isto é, celebrando, a liturgia evangeliza na medida em que introduz no mistério de Cristo. O desafio está em tornar a liturgia sempre capaz de uma linguagem bela e eloquente, inteligível na cultura em que acontece. A mistagogia (isto é: a arte ou a educação de nos introduzir no sagrado, em Jesus Cristo) surgirá então não como mera explicação da linguagem simbólica mas como oportunidade de entrar mais profundamente na linguagem da fé e por isso, como desafia o Papa, projeto de nova evangelização.
Acontece, não raro, que a linguagem litúrgica sofre, nos nossos dias, de uma espécie de esclerose. Quando os gestos não significam nada para o participante, tornam-se mágicos; se explicados, perdem a força. A este propósito, Mons. Sequeri compara a liturgia demasiado intelectualizada e pedagógica a uma mãe que ensina o seu filho a falar com o livro da gramática na mão. Não resulta!

Em todas as culturas humanas é o rito que faz a ponte entre a cultura e a religião. Tudo o que conhecemos é o processo que leva da vida a morte e tudo o que o Homem deseja é o processo inverso – da morte à vida – que, segundo o P.e Giorgio Bonacorsso, é a função do rito, tentativa da grande esperança, grande operação de inversão. Deste modo, a iniciação cristã não pode ser entendida como transmissão de conhecimentos, pois a fé acontece no encontro, mas como imersão do crente em Cristo (Batismo) e de Cristo imerso no crente (Eucaristia). A iniciação é educar a pessoa a sentir-se dentro da cultura e da fé e a liturgia faz as pessoas dentro de Cristo e Cristo dentro dos crentes.

Mais do que a procura de uma estética litúrgica para a nova evangelização, é necessária uma verdadeira inculturação da fé na cultura e a liturgia, pelas suas características rituais, pode ser uma ponte para realizar essa inculturação.
João Paulo Henriques