A conversa do Papa Francisco com Antonio Spadaro, posta em livro com subtítulo TEMOS DE SER NORMAIS, é uma reflexão serena, chã, mas contundente sobre a vida da Igreja. Em síntese: uma Igreja viva é uma comunhão orgânica de fiéis em Cristo, onde a diversidade de dons, de ministérios e de responsabilidades se conjuga para o bem da Comunidade. E essa é a forma de sermos normais!
O Papa confia ao interlocutor que acompanhar o rebanho também significa fiar-se no facto de que ele “tem «faro» para encontrar novos caminhos”. E falou mesmo do “olfato da fé”. Ou seja: o discernimento dos caminhos deve ser feito pela Igreja em profunda comunhão, toda a Igreja, a quem é concedido este “faro” da fé.
É evidente que isto exige uma atitude de radical confiança, no Espírito e na Pessoa Humana, uma abertura plena de todos ao sopro desse espírito, que sopra onde quer, quando quer e como quer. Uma atitude de permanente atenção e perspicácia, para ouvir e escrutinar essas manifestações. Uma comunhão naturalmente vertebrada, mas que atende a todos os membros, sem ceder à tentação de centralismos perigosos.
Por falar em centralismos perigosos, Bergoglio, na palavra dirigida aos cardeais após a sua eleição, usa expressões muito fortes e claras, que desenham o seu paradigma de “intensa comunhão eclesial”. Falou de “conhecimento recíproco e mútua abertura”, “daquela comunidade, daquela amizade, daquela proximidade que fará bem a todos”, de “autêntico afeto colegial”, de “partilhar fraternalmente os nossos sentimentos, as nossas experiências e reflexões”. Todos os ingredientes para a vivência de uma colegialidade afetiva e efetiva, bem distinta de qualquer paradigma monárquico.
Assim sendo, projetos e planificações, reformulação de estruturas, nomeações, designações…, não podem ser concebidas e construídas à secretária, mas terão de ser fruto de uma realidade viva.
E isto a todos os níveis: da Igreja universal, das Dioceses, das Paróquias ou outros círculos de vida eclesial. Clérigos e Leigos, partilhando os seus anseios, sonhos e competências, numa fraterna cooperação, sem preconceitos nem arquétipos exclusivos, fiéis à autêntica Tradição Apostólica, mas livres de todos os condicionamentos culturais que a história foi acumulando.
Uma comunhão sólida e esclarecidamente fundada na Tradição Apostólica, mas fiel também ao Homem de cada tempo, sem medo de mergulhar na sua noite. Como um farol de referência, mas também como o archote que caminha no meio da multidão, iluminando de perto os seus caminhos tantas vezes sinuosos e irregulares.
O caminho faz-se caminhando. Há sempre quem queira voltar atrás, quem tenha saudades das cebolas e da carne dos egitos da história. Mas a esperança que nos salva é a certeza da plenitude do novo Céu e da nova Terra, que não se compraz com saudosismos nem restauracionismos!