Vivia da esperança e difundia-a entre os que encontrava

Vidas que marcam Francisco Xavier Nguyen Van Thuan foi bispo de Nhatrang, de 1967 a 1975, e arcebispo-coadjutor de Saigão a partir de 1975. Nesse mesmo ano, no dia 15 de Agosto, foi preso e detido, pelos comunistas, sucessivamente, nas prisões de Saigão, Nhatrang, Saigão, Haipong, Viñh Phú e Hanói. Foi libertado a 21 de Novembro de 1988. Nomeado vice-presidente e mais tarde presidente do Conselho Pontifício Justiça e Paz, morreria em Roma, no dia 16 de Setembro de 2002, com 74 anos. O seu processo de beatificação está em curso.

É um mártir dos tempos modernos, embora o seu sangue não tenha sido derramado fisicamente. Os tempos de prisão e as palavras que de lá conseguiu fazer sair são exemplo arrastador das vivências mais profundas da fé cristã.

Bento XVI disse dele que “era um homem de esperança, vivia de esperança e a difundia entre todos os que encontrava. Graças a esta energia espiritual resistiu a todas as dificuldades físicas e morais. A esperança sustentou-o como bispo isolado durante treze anos da sua comunidade diocesana; a esperança ajudou-o a perceber o absurdo dos eventos que lhe sucederam – nunca foi julgado durante sua longa detenção – um desígnio providencial de Deus”.

Francisco Van Thuan relata as suas vivências da prisão num livrinho que acaba de ser publicado em português: “Cinco pães e dois peixes” (Ed. Paulinas) – um extraordinário testemunho de fé, dirigido aos jovens, mas de leitura sem dúvida proveitosa para qualquer pessoa, em qualquer idade. O bispo conta como conseguiu comunicar com os seus diocesanos, através de 1001 folhas de calendário (lembrado as histórias das 1001 noites), como, sem Bíblia, apontou em pequenos bocados de papel as 300 frases do Evangelho de que se lembrava, em suma, como sobreviveu a 13 anos, nove deles em isolamento total. Anos “terrivelmente longos”. Ele próprio lembra que há um ditado vietnamita que diz que um dia na prisão é como mil Outonos fora.

Os cinco pães de que fala no livro são a esperança, a fé, a oração, o pão eucarístico, e o pão do amor. Os dois peixes são amor filial a Maria e o seguimento de Jesus. O testemunho do bispo vietnamita inspira-se no relato do cap. 6 do Evangelho de S. João, quando um jovem dá a Jesus cinco pães e dois peixes que servem para alimentar a multidão. Francisco Van Thuan “oferece tudo o que tem para que, através dele, o Senhor possa operar maravilhas”, escreve-se no prefácio. Hoje, podemos saborear do mesmo Pão através do testemunho deste “homem da esperança”.

J.P.F.

Cruz peitoral

«Na montanha de Viñh Phú, num dia de chuva, tive de cortar lenha. Perguntei ao guarda:

– Posso perdir-lhe um favor?

– O que é? Eu ajudá-lo-ei.

– Queria cortar um pedaço de madeira em forma de cruz.

– Você não sabe que é severamente proibido ter qualquer símbolo religioso?

– Eu sei. Mas somos amigos, e prometo escondê-la.

– Seria extremamente perigoso para nós os dois.

– Feche os olhos, farei agora e serei muito cauteloso. Vá andando e deixe-me só.

Talhei a cruz e conservei-a escondida num pedaço de sabão até à minha libertação. Com uma moldura de metal, esse pedaço de madeira tornou-se a minha cruz peitoral».

Francisco Van Thuan

in “Cinco pães e dois peixes”,

Ed. Paulinas, pág. 55-56